Quando "Cristo é Rei" vira polêmica: o perigo de esvaziar expressões bíblicas em nome do "conservadorismo"
Como a análise de Jordan Peterson sobre um termo fundamental da fé cristã revela armadilhas sutis
"Em sua veste e em sua coxa está escrito este nome: Rei dos Reis e Senhor dos Senhores" (Apocalipse 19:16)
Nos últimos dias, navegando pela internet, me deparei com uma postagem de Jordan Peterson no X (antigo Twitter) que me deixou bem preocupado.
Antes de continuar, deixa eu explicar quem é esse tal Jordan Peterson para quem não o conhece.
Peterson ficou famoso há alguns anos por criticar o politicamente correto. O que realmente o colocou nos holofotes foi quando ele se posicionou contra uma lei no Canadá que obrigaria as pessoas a usar os pronomes de identidade de gênero escolhidos por cada indivíduo. Essa postura o tornou popular rapidamente, inclusive aqui no Brasil, onde seus vídeos eram muito compartilhados, especialmente por pessoas que se identificavam com ideias de direita.
Eu recebia tanto conteúdo dele nas minhas redes sociais que acabei comprando alguns de seus livros para entender melhor o que esse novo "porta-voz do conservadorismo" tinha a dizer. Li primeiro o "12 Regras para a Vida: Um Antídoto para o Caos" – um livro interessante, com certeza, mas não daqueles que dá vontade de reler.
A grande razão pela qual muitos "conservadores" e "cristãos" ainda admiram Peterson é que ele defende com força que a tradição judaico-cristã é – e deve continuar sendo – a base moral do Ocidente. O curioso é que ele defendia isso mesmo quando dizia abertamente que vivia "como se Deus não existisse". Agora, embora diga que acredita em Deus, ele quase nunca explica o que isso realmente significa para ele.
Bem, agora que você sabe quem é Peterson, vamos voltar à postagem dele que me deixou intrigado...
O que Jordan Peterson afirmou?
Como eu estava dizendo, Peterson compartilhou uma análise preocupante sugerindo que a expressão "Cristo é Rei" estaria sendo "sequestrada" por extremistas na internet. Quando li isso, logo me perguntei: será que é verdade mesmo?
Em sua publicação, Peterson – esse intelectual que se diz conservador, mas não se declara cristão de fato – compartilhou e apoiou um estudo acadêmico chamado "Em Teu Nome em Vão: Como Extremistas Online Sequestraram 'Cristo é Rei". De acordo com esse estudo, grupos extremistas nas redes sociais estariam se apropriando dessa expressão teológica, principalmente para espalhar ideias antissemitas e de supremacia branca.
O argumento principal é que frases como "Cristo é Rei", que tradicionalmente são usadas em contextos de adoração e devoção, estariam virando códigos secretos para promover ideologias extremistas. Os pesquisadores mostram que houve um aumento grande no uso dessa expressão em ambientes políticos polarizados, especialmente entre 2021 e 2024.
Olhando por cima, poderíamos pensar que Peterson está fazendo um favor aos cristãos, alertando sobre o mau uso de uma expressão sagrada. Mas precisamos analisar com cuidado duas questões importantes: primeiro, isso é realmente verdade? E segundo, independentemente de ser verdade ou não, quais são as consequências dessas afirmações para nossa fé?
Como vamos ver ao longo deste texto, a crítica desse "conservador" pode acabar, sem querer, contribuindo para a censura de cristãos sinceros e esvaziando o significado profundo da verdade de que Cristo é o Senhor sobre todas as coisas.
As fragilidades do estudo que embasou Peterson
Olhando com mais atenção para o estudo citado por Peterson, encontrei vários problemas metodológicos e teóricos que precisamos considerar:
Dados muito limitados: A pesquisa se concentra apenas em plataformas de mídia social (Twitter/X e Instagram) e em períodos específicos, ignorando completamente como essa expressão é usada historicamente em contextos religiosos. Esse método acaba dando destaque exagerado a casos polêmicos online, enquanto ignora o uso predominante da expressão nas igrejas, liturgias e na vida devocional dos cristãos.
Causa e efeito sem comprovação: O estudo simplesmente assume que o aumento no uso da frase está ligado a motivações extremistas, sem provar adequadamente essa conexão. Esse aumento poderia ter várias outras explicações, inclusive um verdadeiro avivamento religioso (algo que o próprio estudo menciona de passagem).
Números fora de contexto: Quando os pesquisadores falam de um aumento "de cinco vezes" no uso da expressão, eles não contextualizam esses números. Na verdade, mesmo com esse aumento, o uso da expressão por extremistas pode ainda ser uma pequena fração do total de vezes que "Cristo é Rei" é usado pelos cristãos no mundo todo.
Ignorando 2.000 anos de história: O estudo menciona rapidamente as raízes teológicas da expressão, mas não reconhece seu lugar central na cristologia e na escatologia cristãs ao longo de dois milênios – muito antes de qualquer uso político atual.
Essas falhas sugerem que, embora possam existir alguns casos isolados de mau uso da expressão, a conclusão de que "Cristo é Rei" foi amplamente "sequestrada" parece exagerada e não tem base sólida.
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O significado profundo de "Cristo é Rei" na fé cristã
Para equilibrar a visão reducionista apresentada pelo estudo, vamos considerar o rico significado teológico dessa expressão fundamental para nossa fé.
Na tradição cristã, afirmar que "Cristo é Rei" significa muito mais que um simples slogan:
Uma verdade central do Evangelho: Não estamos falando apenas de salvação pessoal, mas da boa notícia de que Deus, através de Jesus Cristo, estabeleceu seu reinado sobre toda a criação. Essa é a mensagem central do Novo Testamento.
Um Reino que já chegou, mas ainda não em plenitude: O Reino de Deus começou com a vida, morte e ressurreição de Jesus; continua se expandindo através da Igreja; e será completamente realizado na sua volta. É um "já" que vivemos, mas também um "ainda não" que esperamos.
A cruz como trono: De um jeito que parece contraditório para a lógica humana, Jesus é entronizado como Rei justamente na cruz – não conquistando pela força, mas pelo amor e sacrifício. Seu trono é a cruz, sua coroa é de espinhos – um tipo de realeza que muda completamente nossa ideia de poder.
A transformação de tudo: O reinado de Cristo não se limita à nossa vida espiritual, mas inclui a renovação de toda a criação, com implicações sociais, econômicas e ambientais. Seu governo afeta todos os aspectos da existência.
Essa compreensão profunda mostra como a expressão "Cristo é Rei" está enraizada na própria essência do que cremos, sendo muito mais que um slogan político de qualquer lado do espectro ideológico.
O perigo de desvalorizar termos cristãos
O que mais me incomoda na abordagem de Peterson (e do estudo que ele cita) é como isso pode acabar desvalorizando expressões fundamentais da nossa fé, apenas por causa de associações superficiais com extremismos políticos. Essa análise pode trazer consequências sérias:
Medo de expressar a fé: Cristãos sinceros podem começar a evitar certas expressões teológicas importantes, com medo de serem vistos como extremistas.
Empobrecimento teológico: Termos ricos em significado espiritual acabam reduzidos a meras expressões políticas, perdendo seu poder de transformar vidas.
Censura religiosa: No pior cenário, expressões genuinamente religiosas podem ser marginalizadas ou até mesmo censuradas no debate público.
Divisão entre cristãos: Cria-se uma separação artificial entre cristãos "aceitáveis" (que evitam certas expressões) e cristãos "radicais" (que as mantêm).
O que estamos vendo aqui é algo preocupante: alguém que se apresenta como defensor de valores tradicionais acaba contribuindo para enfraquecer esses mesmos valores ao endossar uma análise que reduz profundas verdades teológicas a simples códigos políticos.
Para concluir
O caso de Jordan Peterson e sua análise sobre "Cristo é Rei" nos ensina uma lição importante: precisamos estar atentos não só aos ataques diretos à nossa fé, mas também às críticas sutis que podem vir de pessoas que aparentam defender valores tradicionais.
A expressão "Cristo é Rei" não pertence a extremistas políticos de nenhum lado. Ela pertence à Igreja de todos os tempos e lugares que confessa Jesus Cristo como Senhor. Não devemos deixar que análises superficiais nos intimidem ou nos façam hesitar em proclamar esta verdade fundamental da nossa fé.
Como diz Filipenses 2:9-11: "Por isso Deus o exaltou à mais alta posição e lhe deu o nome que está acima de todo nome, para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho, nos céus, na terra e debaixo da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para a glória de Deus Pai".
Cristo é Rei – ontem, hoje e eternamente. E nenhuma análise de tendências nas redes sociais vai mudar essa verdade.
🧠 Processando na mente
📕 O que estou lendo:
A Conquista das Virtudes - Faus
Falta pouco para a conclusão do livro iniciado nas últimas semanas. Já disse para vocês que o livro é muito interessante para quem deseja trabalhar o caráter cristão.
🎵 O que estou ouvindo:
Permaneço escutando Brett Dennen. Hoje arrisquei essa canção no violão.
🎬 O que estou assistindo:
Ancelotti vai dar certo na selação?
Esperamos que sim, a copa do mundo já está logo aí⚽
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Victor Romão.